Escolhemos como notícia em destaque desta semana a matéria preparada pela revista Isto é a respeito do exercício da função atípica do STF, de legislador, que a cada dia torna-se mais comum, diante da “paralisia legislativa” do Congresso.
A referida matéria foi veículada na resvista ISTO É nº 2175.
Confira a referida matéria :
Supremo legislador federal
Deputados e senadores estão mais preocupados com emendas orçamentárias e distribuição de cargos do que em elaborar leis, e o STF passa a exercer mais o papel dos parlamentares
Adriana Nicacio
UNGIDOS
Apenas 11 ministros tomam as decisões que caberiam aos
representantes eleitos democraticamente pelo povo brasileiro
Apenas 11 ministros tomam as decisões que caberiam aos
representantes eleitos democraticamente pelo povo brasileiro
Nos últimos meses, o Congresso esteve praticamente paralisado. Envolvido pelas crises do Executivo, limitou-se a emendar projetos remetidos pelo próprio governo, brigar pela liberação de verbas e, como tem sido a praxe, não regulamentou sequer um dos inúmeros projetos de interesse da população que tramitam na Casa há muitos anos. Enquanto deputados e senadores passaram o semestre a discutir temas de sua própria cozinha, os 11 ministros do Supremo Tribunal Federal fizeram o que os parlamentares têm se recusado a fazer: legislar. Só este ano o STF determinou que casais do mesmo sexo podem unir-se legalmente e que a Lei da Ficha Limpa só vale a partir do ano que vem, temas de extrema importância que deveriam ter sido decididos democraticamente pelo Congresso.
E nada indica que a situação vai mudar no médio prazo. Quando voltar do recesso em agosto, a Suprema Corte tem uma agenda lotada de decisões sobre matérias engavetadas há anos pelo Congresso. O presidente do STF, ministro Cezar Peluso, adianta que ainda este ano o tribunal pretende dar sua posição sobre a criação de novas regras para o aviso prévio, a permissão para o aborto de fetos anencéfalos e a demarcação de áreas de quilombolas. O ex-presidente do STF ministro Gilmar Mendes concorda que o Supremo não pode substituir o Congresso, mas afirma que há “paralisia institucional” e falta “agenda legislativa”. “As forças políticas se digladiam e não encontram solução para os temas.
O Congresso tem condições mais democráticas para legislar, com audiências públicas, mas na omissão legislativa é preciso decidir”, diz Gilmar Mendes.
Enquanto o STF se torna o supremo legislador federal, o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS) tem outras preocupações. Ele pede “publicamente” que o governo reveja sua posição de não prorrogar os prazos para o repasse dos restos a pagar, relativos ao Orçamento de 2009. E quando voltar do recesso, em agosto, encontrará a pauta de votações trancada por medidas provisórias que não foram apreciadas no primeiro semestre. No seu primeiro mandato, o senador Pedro Taques (PDT-MT) é uma das poucas vozes dissonantes no Parlamento. Ele reclama que o Congresso só pensa em “emendas e cargos” e que os parlamentares se tornaram despachantes do Orçamento da União. Ele tenta unir forças com outros colegas para “restaurar a atividade legislativa” e levar as duas Casas a pautar as grandes discussões. “Estamos caminhando para o ativismo judicial, em que 11 deuses decidem o que é bom. Não é legítimo numa democracia. Eles não foram eleitos”, diz o senador.
Mas, apesar da constatação de que o Parlamento anda inerte, são poucos os deputados e senadores que se aventuram em tentar levar à votação temas polêmicos. Um dos principais juristas do País, Ives Gandra Martins, 76 anos, lembra que participou de audiências com o relator da Constituinte, deputado Bernardo Cabral, e diz que não era a intenção dos constituintes que o Supremo fizesse as leis. “Tenho admiração pelos ministros do STF e livros publicados com alguns deles, mas o Supremo está incinerando o artigo 102 da Constituição. Ele não pode legislar”, diz Gandra Martins. Poder, não pode. Mas quem pode parece não estar muito interessado em fazê-lo.
Mas, apesar da constatação de que o Parlamento anda inerte, são poucos os deputados e senadores que se aventuram em tentar levar à votação temas polêmicos. Um dos principais juristas do País, Ives Gandra Martins, 76 anos, lembra que participou de audiências com o relator da Constituinte, deputado Bernardo Cabral, e diz que não era a intenção dos constituintes que o Supremo fizesse as leis. “Tenho admiração pelos ministros do STF e livros publicados com alguns deles, mas o Supremo está incinerando o artigo 102 da Constituição. Ele não pode legislar”, diz Gandra Martins. Poder, não pode. Mas quem pode parece não estar muito interessado em fazê-lo.